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quarta-feira, 22 de abril de 2009

"FILOSOFIA E COTIDIANO."

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Propaganda do livro da psicóloga CRISTINA LEVINE.
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FILOSOFIA E COTIDIANO.
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*CRISTINA LEVINE MARTINS XAVIER
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A inclusão obrigatória das disciplinas de Sociologia e Filosofia no currículo das escolas públicas e privadas de Ensino Médio (Parecer CNE 38/2006) é uma dessas decisões bem-vindas, que geram um certo otimismo quanto à formação e educação do jovem brasileiro. Ainda que seja questionada por alguns, a questão merece atenção especial de toda a sociedade.
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A proposta é que, ao deixar o ensino médio, o estudante que conhecer as bases das duas disciplinas estará mais capacitado para desenvolver pensamento autônomo e crítico e exercer a cidadania plena. Sobre esse assunto, um professor de Sociologia e de Prática Pedagógica em Ciências Sociais na UFRGS, de Porto Alegre, fez um comentário importante na Internet: “Não é possível falar em consolidação da democracia em nosso país sem que nossos estudantes tenham uma formação humanista e reflexiva sobre sua condição de sujeitos historicamente situados”.
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Há nesta afirmação uma profunda sabedoria. Ela sintetiza aspectos que estão no âmago tanto das remotas origens da história da democracia como da própria filosofia. Ambas surgiram na antiga Grécia e estão intimamente vinculadas com o debate ou diálogo em praça pública.
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A filosofia não foi criada para circular apenas em um meio elitizado de intelectuais e acadêmicos. Para Lou Marinoff, principal líder nos Estados Unidos de uma nova corrente de pensamento que aplica a filosofia ao dia-a-dia, ela era, em sua origem, um “modo de vida” e não uma disciplina acadêmica: “Somente por volta do século passado, a filosofia foi confinada numa ala esotérica da torre de marfim, repleta de insights teóricos, mas vazia de aplicação prática”, escreve ele em seu famoso livro Mais Platão menos Prozac.
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Segundo Marilena Chauí, Sócrates, considerado o patrono da filosofia, rebelou-se contra os sofistas (mestres da oratória ou retórica), dizendo que não eram filósofos, pois não tinham amor pela sabedoria nem respeito pela verdade, elementos essenciais na discussão filosófica. Do mesmo modo como vemos hoje em nosso (cada vez mais degradante) cenário político, Sócrates acusava os sofistas de corromper o espírito dos jovens ao colocar toda ênfase nas vantagens pessoais obtidas com suas técnicas de argumentação e persuasão.
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O estudo da filosofia visa, entre outros benefícios, formar indivíduos capazes de pensar crítica e eficazmente por si próprios, e, como conseqüência, serem capazes de fazer uma argumentação mais consciente, reflexiva e segura em todas as áreas da vida. Nietzsche já antevia, no fim do século XVIII, a tendência profissionalizante e histórico-cientificista das universidades e escolas técnicas, mais preocupadas em formar com rapidez indivíduos aptos a preencher as demandas do mercado de trabalho e executarem serviços com eficiência do que preparar humanística e qualitativamente pessoas para lidar com as condições complexas da vida. O antídoto, segundo ele, para o instinto desenfreado da ciência, que tudo quer conhecer, dissecar e analisar, é a arte e a filosofia.
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Sem a capacidade de raciocínio e reflexão clara sobre nossa realidade imediata, nós nos tornamos meros reprodutores do sistema de valores, crenças, preconceitos e costumes vigentes. Na maioria das vezes, nem percebemos que nossa vida prática é guiada não por nossa própria filosofia de vida, mas pela de nossos antepassados ou pelo input cultural. Não que estejamos errados em nos apoiar nos valores e tradições que nos ensinaram, mas poderíamos desenvolver esta capacidade inata de discriminar melhor o que nos serve e que aumenta nossa vitalidade e criatividade.
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O evoluir do autoconhecimento, proporcionado por uma constante reflexão sobre nós mesmos, nossas atitudes e nossas experiências, está na base de uma postura ética de vida, pois ser ético e moral não significa apenas seguir à risca um código social de leis e normas de conduta. Sem uma ética pessoal e a busca por autoconhecimento, perdemos parte de nosso livre-arbítrio, criando situações de vida caóticas e insatisfatórias.
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Precisamos mais de diálogo do que diagnóstico. Mais Platão e menos Prozac! Não só para os alunos do Ensino Médio, como a todas as pessoas. Marinoff recomenda simplesmente o que vem a ser uma tendência evidente na área de saúde: é melhor prevenir do que remediar. Entupir-nos de remédios ou recorrer a cirurgias plásticas não nos liberta de nossas dores de consciência e crises de vida. Só nos distancia de nós mesmos.
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*É mestre em Ciências da Religião pela PUC/SP
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